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  • Programa de Evidencias em Políticas e Tecnologias em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz

O uso de Cannabis Medicinal para transtornos mentais: evidências de eficácia e segurança

Informe realizado por Programa de Evidencias em Políticas e Tecnologias em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz apresenta as evidências disponíveis sobre o uso de Cannabis Medicinal para transtornos mentais. Para tal, foi realizado um scoping review1 de revisões sistemáticas (RS).


CARACTERÍSTICAS DA DOENÇA

Transtornos mentais são cada vez mais reconhecidos como uma prioridade global da saúde. Sabe-se que as estimativas da prevalência de transtornos mentais com base em pesquisas transversais subestimam sua verdadeira prevalência. A OPAS estima que os transtornos metais são os responsáveis por quase um quinto do total de DALYs no continente Americano, constituindo a maior causa de subgrupo de doenças em termos de incapacidade e mortalidade combinadas. A maior causa mental de DALYs são os transtornos depressivos, que representam 3,35% do total de DALYs, seguidos pelos transtornos de ansiedade (2,10%), desordens neurocognitivas (1,95%), auto-mutilação (1,62%) e esquizofrenia (0,86%).

POPULAÇÃO ALVO E DESFECHOS

Realizou-se a busca sobre o uso de Cannabis Medicinal em pacientes <18 anos e pacientes adultos com transtornos mentais. Todos os desfechos identificados na busca deste scopping review foram avaliados e incluídos em síntese narrativa.


TECNOLOGIA AVALIADA

A cannabis conter mais de 100 compostos canabinoides distintos, vários dos quais têm efeitos psicoativos comprovados ou potenciais usados a centenas de anos por diversas culturas. Os primeiros canabinoides a serem identificados com tais efeitos foram o delta‐9‐etrahidrocanabinol (Δ9-THC), principal composto psicoativo, e o Canabidiol (CBD),

composto não psicoativo, embora se pense que haja muitos outros canabinoides, alguns dos quais podem modular a resposta ao Δ9-THC5. Mais recentemente, tem havido um interesse crescente no potencial neuro protetor dos canabinoides para condições neurológicas e nas propriedades antipsicóticas do CBD. Evidências pré-clínicas sugerem que os canabinoides podem atenuar a neuro degeneração, reduzindo a excitotoxicidade e os danos oxidativos via receptores CB1 O uso de Cannabis Medicinal para transtornos mentais: evidências de eficácia e segurança e CB2 e mecanismos independentes do receptor. No caso do CBD, há indicações de que ele pode modular o sistema endocanabinóide, aumentando os níveis de anandamina, reduzindo assim os sintomas psicóticos. Embora a Cannabis tenha sido usada há séculos por suas propriedades psicoativas, o Δ9-THC, CBD e vários agonistas de receptores de canabinoides foram investigados como medicamentos para uma ampla gama de condições, incluindo alívio da dor, condições gastrointestinais, tratamento da aterosclerose, inibição da angiogênese, alívio da sintomas de esclerose múltipla, Alzheimer e esclerose lateral amiotrófica, alívio de sintomas da síndrome de Tourette, para transtornos de ansiedade, transtorno de déficit de atenção com hiperatividade, depressão, lesão cerebral, tratamento da discinésia tardia associada a neurolépticos, tratamento de glaucoma, tosse e prurido colestático.


REGULAMENTAÇÃO DA TECNOLOGIA NO MUNDO

A Nabilona, um canabinoides sintético, foi o primeiro medicamento registrado em 1981 para a supressão de náuseas e vômitos devido à quimioterapia do câncer. O próprio Δ9-THC, na forma sintética do Dronabinol, também foi registrado como antiemético (em 1985) e mais tarde (em 1992) para tratamento de anorexia associada a perda de peso excessiva em pacientes com Aids. Em 2005, uma combinação de Δ9-THC e CBD foi registrada para o alívio da dor neuropática em pacientes com esclerose múltipla e como um auxílio ao alívio da dor em pacientes com câncer avançado. Um antagonista dos canabinoides, o Rimonabant, foi inicialmente registrado como um agente de controle de obesidade, mas posteriormente retirado por motivos de segurança.


INFORMAÇÕES SOBRE EFICÁCIA E SEGURANÇA

Alteração de Humor

Foram identificadas duas RS sobre o uso de canabinoides para tratamento de alteração de humor. Uma revisão sistemática avaliou os efeitos do Dronabinol para alteração de humor. Segundo os autores, o Dronabinol melhorou o humor no ponto final em 7% dos pacientes e no grupo placebo em 2% (p=0,14). Segundo a percepção dos pacientes avaliados, o humor melhorou em 10% no grupo Dronabinol e diminuiu no grupo placebo e 2% (p=0,06). Na análise, em todos os 139 pacientes deste estudo, os canabinoides foram associados a uma melhora no humor, mas isso não foi estatisticamente significativo (p=0,16) (RR 4,96; IC 95% 1,51 a 16,27). A outra RS identificou dois estudos. Um relatou uma melhora no humor deprimido entre 60% dos pacientes que receberam extrato de cannabis (THC/CBD), em comparação com 46% dos pacientes tratados apenas com THC e 64% dos que receberam placebo, mas essas diferenças não foram significativas (p=0,461). O outro não mostrou diferença significativa entre os efeitos de três doses diferentes de Nabiximóis e placebo (p=0,48; p=0,15; p=0,08). A qualidade da evidência era muito baixa.

Anorexia

Quatro RS avaliaram os efeitos dos medicamentos à base de Cannabis para tratamento de Anorexia. As revisões avaliaram os efeitos do Dronabinol e do Δ9-THC. O Δ9-THC para tratamento da anorexia estimula o apetite e ajuda a retardar a perda de peso crônica em adultos. Comparado ao placebo, o Δ9-THC oral induziu uma estimulação acentuada do apetite, estatisticamente significativa, após 4-6 semanas. Entretanto, quando comparado com o Megestrol, o Δ9-THC não apresentou resultados satisfatórios. O Megestrol sozinho estimulava o apetite em 75% dos indivíduos e induzia um ganho de peso em 11% dos indivíduos, enquanto o Δ9-THC oral estimulava o apetite em 49% dos pacientes e produzia um ganho de peso em 3% dos pacientes. Essas duas diferenças foram estatisticamente significativas. Além disso, a terapia combinada entre fármacos não conferiu benefícios adicionais.

Uma revisão identificou 11 mulheres com anorexia nervosa tratadas com Δ9-THC ou Diazepam. Mostrou-se que ganho de peso foi semelhante entre os tratamentos. Três pacientes no grupo tratado com Δ9-THC foram retirados devido a reações disfóricas graves. Na mesma revisão, identificou-se que em dois tratamentos de 4 semanas separados por um período de lavagem de 4 semanas, o Dronabinol produziu ganho de peso significativo de 0,73kg (p<0,01), em comparação com o placebo.

Duas RS demonstraram efeito positivo do Dronabinol no tratamento de falta de apetite em pacientes com HIV. Uma delas, com 139 pacientes, identificou que o Dronabinol foi significativamente superior ao placebo: enquanto o peso corporal dos pacientes em uso de Dronabinol (2,5mg duas vezes por dia) permaneceu constante, os do grupo placebo perderam peso (média 0,4 kg). Porém, a dose baixa de Dronabinol (2,5mg duas vezes por dia) foi inferior à dose alta de Acetato de Megestrol (750mg)10. Na segunda revisão sistemática, os autores apontam para alguma evidência de que o Dronabinol está associado a um aumento de peso quando comparado ao placebo. Evidências mais limitadas sugerem que ele também pode estar associado ao aumento do apetite, maior porcentagem de gordura corporal, náusea reduzida e melhora do status funcional. No entanto, esses resultados foram avaliados principalmente em estudos únicos e as associações não alcançaram significância estatística.


Demência

O efeito de canabinoides na demência foi identificado em duas revisões 5,6. Foi relatado que o comportamento perturbado, medido pelo CMAI, diminuiu durante os períodos de tratamento com Dronabinol e essa diminuição persistiu durante o período de placebo após o tratamento com Dronabinol. O Dronabinol também apresentou redução de agitação noturna e reforçaram os ritmos circadianos nos 2 pacientes com demência, em uma dose de 2,5mg por 4 semanas. Entretanto, quando avaliado eficácia de cápsulas de Δ9-THC (0,75 a 1,5 mg), não foi identificado melhora nos sintomas neuropsiquiátricos em pacientes com demência.


Esquizofrenia e Psicose

Uma revisão considerou a categoria de evidência para o tratamento a curto prazo da esquizofrenia resistente ao tratamento como C1, grau 4 de recomendação. Segundo os autores, o CBD produziu efeito antipsicótico em estudos pré-clínicos e em modelos de psicose em indivíduos saudáveis. Quando avaliado o uso de 300 ou 600mg, foi identificado que o CBD evitava sintomas psicóticos induzidos por 10 mg de THC. No pré-tratamento com 600mg o CBD inibiu a psicose e o comprometimento cognitivo induzido pelo Δ9-THC, mas o resultado não foi estatisticamente significativo. Quando avaliado a eficácia do CBD no tratamento da esquizofrenia, a evidência não é certa. Foi identificado resultados comparáveis na redução dos sintomas entre CBD e Amisulprida em pacientes com esquizofrenia paranoica aguda e psicose esquizofreniforme em dois estudos. Outros dois não identificaram diferenças entre CBD e placebo no primeiro episódio de esquizofrenia. Nenhuma informação sobre os efeitos a longo prazo do CBD na esquizofrenia está disponível, mas constatou-se que tratamento com CBD apresentou um perfil de efeito colateral superior ao tratamento com Amisulprida.


Síndrome Gilles de la Tourette (SGT) e outros distúrbios de tique

O uso de canabinoides para controle de distúrbios de tiques vem sendo amplamente investigado, sendo a SGT o distúrbio mais investigado na literatura localizada. Diversos autores investigaram os efeitos do Δ9-THC na redução de tiques em pacientes com SGT. O Δ9-THC mostrou-se eficaz na redução da gravidade e frequência dos tiques em comparação com o placebo. Um estudo identificou uma tendência a melhora significativa durante e após o tratamento, enquanto avaliavam a extensão da memória verbal imediata. Eles concluíram que o tratamento com Δ9-THC oral em pacientes que sofrem da SGT não prejudicou sua função cognitiva e pode até melhorá-la. Uma análise mais aprofundada dos subescores encontrou uma melhora significativa nas pontuações para tiques motores complexos (p=0,015).


Uma revisão avaliou o uso do Δ9-THC (5 a 10mg/dia) em outros distúrbios de tique em 28 pacientes, com idade entre 18 e 69 anos. Relatou-se efeito positivo do Δ9-THC, embora as melhorias na frequência e na gravidade dos tiques tenham sido pequenas e detectadas apenas por alguns instrumentos de avaliação15. Não foram relatados eventos adversos graves. Cinco pacientes do grupo THC relataram cansaço, boca seca e tontura. Não há evidências suficiente para apoiar o uso de canabinoides no tratamento de tiques em crianças ou adolescentes. Há apenas um relato de caso de um paciente de 16 anos que apresentou melhoras na gravidade do tique e qualidade de vida após uso de canabinoides. Por isso, Pringsheim e colaboradores classificam a evidência como Categoria X, nível 2, não recomendado, o uso de canabinoides em crianças e adolescentes com distúrbios de tique. Para a população adulta, o grau de recomendação para canabinoides é fraca, pois a evidência é de baixa qualidade.


Transtorno Bipolar (TB)

O efeito do CBD em pacientes com TB foi relatado em duas RS. Segundo Turna e colaboradores, foi identificado tratamento para 2 pacientes onde, do dia 6 ao 30, foi administrado duas doses de CBD (dose inicial de 600mg/dia aumentada para 1200mg/dia) com Olanzapina adjuvante (10–15mg/dia, descontinuada no dia 20). No dia 31, o tratamento com CBD foi substituído por placebo por 5 dias. Embora os pacientes tenham tolerado bem o CBD, as melhorias observadas foram limitadas ao primeiro caso (tomar CBD e Olanzapina) com reduções de 37 e 33% na Young Mania Rating Scale e Brief Psychiatric Rating Scale (ambas para medir a gravidade dos sintomas), respectivamente. Não existem estudos clínicos sobre o uso de CBD no tratamento do transtorno bipolar. Considerando esses resultados, Khoury e autores classificaram as evidências sobre o uso de CBD no transtorno bipolar como categoria F, considerando a falta de estudos adequados que comprovem eficácia ou não eficácia.


Transtorno de Ansiedade

Os transtornos de ansiedade são condições crônicas e incluem síndrome do pânico, agorafobia, transtorno de ansiedade social (TAS), transtorno de ansiedade generalizada (TAG) e fobias específicas, sendo associados a um fardo significativo para os indivíduos afetados, suas famílias e a sociedade, e frequentemente coocorrem com outros problemas psiquiátricos. O Δ9-THC demonstrou efeitos bifásicos dependentes da dose para induzir ou diminuir os níveis de ansiedade em adultos saudáveis17. Em doses específicas, os dados de neuroimagem também demonstraram que o Δ9-THC pode aumentar ou diminuir a excitação emocional / processamento de estímulos negativos. Ao contrário do Δ9-THC, o CBD demonstrou repetidamente uma capacidade ansiolítica e aboliu com sucesso os efeitos ansiogênicos do Δ9-THC17.

Khoury e colaboradores realizaram ampla revisão sobre o uso de canabinoides em transtorno de ansiedade. Os autores identificaram uma comparação o efeito de 300mg de CBD com Ipsapirona, Diazepam e placebo na ansiedade subjetivamente percebida, medida por uma escala visual de humor analógica em 40 indivíduos saudáveis. Observou-se que que o CBD reduziu significativamente a ansiedade subjetiva percebida quando comparado ao placebo, sem causar sedação como o Diazepam.

Já para a dose de 40mg de CBD oral para reduzir a ansiedade induzida por procedimentos de neuroimagem, foi analisado o fluxo sanguíneo cerebral em 10 homens saudáveis. Cada sujeito foi avaliado em duas ocasiões diferentes, com uma semana de intervalo. Na primeira sessão, após um período de adaptação de 30 minutos, os indivíduos receberam uma dose única de CBD oral ou placebo. Foi realizada tomografia computadorizada por emissão de fóton único em diversos momentos e analisadas usando o Visual Analogue Mood Scale. Na segunda sessão, um procedimento idêntico foi seguido, exceto que o outro medicamento foi administrado. O CBD diminuiu significativamente a ansiedade subjetiva e aumentou

a sedação, enquanto o placebo não induziu mudanças significativas. Foi identificada evidência para TAG com dose única de 600mg de CBD ou placebo, onde os participantes foram submetidos a um teste simulado de falar em público. O pré-tratamento do CBD reduziu significativamente a ansiedade medida pela escala visual analógica de humor. Em dose única de 400mg de CBD foi associada a uma diminuição significativa da ansiedade subjetiva medida pela escala visual analógica de humor (p<0,001). Outra revisão revelou o CBD estava associado a uma maior melhoria no fator de ansiedade de uma escala visual de humor analógica (diferença média da linha de base, −16,52; valor de p=0,01) em comparação com o placebo durante um teste simulado de falar em público. Já para tratamento do TAS, foi identificado o efeito ansiolítico de 400mg de CBD dissolvidos no óleo de milho12. Após tomar CBD ou placebo, os participantes avaliaram a ansiedade pelo VAMS em diversos momentos12. O CBD reduziu significativamente a ansiedade subjetiva em todos os parâmetros após a ingestão do fármaco. Na dosagem de 600mg de CBD dissolvido, houve redução significativa da ansiedade, o comprometimento cognitivo e o desconforto durante o desempenho da fala e diminuiu o alerta em uma fala antecipatória em pacientes com TAS. O grupo placebo apresentou níveis mais elevados de ansiedade, comprometimento cognitivo, desconforto e alerta quando comparado ao grupo controle. Essa base ansiolítica do CBD é apoiada ainda por estudos de neuroimagem que associam a administração de CBD com atividade reduzida nas regiões límbicas e paralímbicas durante tarefas de processamento emocional da face. Uma revisão investigou 1mg de Nabilona administrada duas vezes ao dia por 28 dias com o placebo, melhorando significativamente a ansiedade medida pela Hamiliton Rating Scale for Ansiety. Por fim, uma RS identificou evidências sobre o uso do Dronabinol em populações saudáveis. Identificou-se que a administração de Dronabinol (7,5mg) reduziu a reatividade límbica (amígdala lateral direita) a rostos com raiva ou medo durante uma tarefa de processamento de rostos emocionais. Ainda, os autores identificaram evidências de uma combinação de condicionamento e extinção pavloviano com Dronabinol (7,5mg) ou placebo 2 horas antes da aprendizagem da extinção em indivíduos saudáveis17. Eles testaram a retenção de extinção 24 horas depois, revelando que a administração oral de Dronabinol em indivíduos saudáveis antes da extinção de uma resposta de medo aprendida foi encontrada para facilitar a extinção do medo. Além disso, os dados de ressonância magnética relacionaram essa taxa de extinção aumentada ao aumento do córtex pré-frontal ventromedial e à atividade do hipocampo a um estímulo condicionado previamente extinto.


Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT)

O uso de Nabilona para tratamento de TEPT foi identificado em três RS. Comparado ao placebo, a Nabilona reduziu significativamente (p=0,03) os pesadelos, conforme medido pela escala PSTD (avalia a duração dos sintomas, sofrimento subjetivo, impacto dos sintomas no funcionamento social e ocupacional e melhora dos sintomas). Além disso, a escala CGI-C (avalia a resposta terapêutica) indicou uma melhora global maior no grupo tratado com Nabilona (1,9 ± 1,1, isto é, muito melhora) do que o grupo placebo (3,2 ± 1,2, isto é, melhora mínima). Quando avaliado a partir do Post-Traumatic Stress Disorder Checklist - Civilian Version (avalia as conseqüências de diversos tipos de experiências traumáticas), a Nabilona revelou reduções significativas nos scores PCL‐C (38,8 [DP, 7,1]; t57=10,2, p=0,001)17. Utilizando o Global Assessment of Functioning pós-traumático (avalia

subjetivamente o funcionamento social, ocupacional e psicológico), identificou-se média de 58,2 pontos (DP, 8,4; t100=16,9; p=0,001), do pré ao pós-tratamento. Também foi observado número significativamente maior de horas dormidas (p<0,001) e diminuição da frequência de pesadelos (p<0,001)17. Da mesma forma, a nabilona adjunta também mostrou cessação ou redução significativa de pesadelos (p=0,03). A maioria experimentou uma recorrência de pesadelos quando a Nabilona foi interrompida.

Também foi identificada nas revisões os efeitos do Δ9-THC adjuvante. Os pacientes receberam 100mg de Δ9-THC dissolvido em 4ml de azeite e receberam instruções para tomar 0,1 ml (equivalente a 2,5mg) embaixo da língua 1 hora após acordar e 2 horas antes de dormir. Se tolerada, a dose foi aumentada para 0,2ml (equivalente a 5mg). Alterações estatisticamente significativas após o tratamento incluíram diminuição dos sintomas hiperarousais de TEPT (p<0,02), CGI-I (p<0,03) e CGI-S (p<0,02), qualidade do sono, frequência de pesadelos (p<0,04) e pontuação da Pesquisa de efeitos de pesadelo (p<0,002). Além disso, dois pacientes notaram remissão completa de seus pesadelos no pós-tratamento. Entretanto, para O’Neil e colaboradores não há evidências suficientes sobre os benefícios e malefícios das preparações à base de cababinoides para pacientes adultos com TEPT. O corpo de literatura atualmente disponível é limitado por pequenas amostras, falta de ajuste para possíveis fatores de confusão importantes, desenhos de estudos transversais e uma escassez de estudos com grupos de controle que não usam maconha.

Apenas um estudo identificou os efeitos de canabinoides em <18 anos16. O CBD melhorou a ansiedade e o sono em um relato de caso de uma menina de 10 anos com TEPT de trauma na primeira infância.


Outros transtornos mentais

Outros transtornos mentais tratados com canabinoides foram identificados. Um estudo sobre Problemas Cognitivos, um sobre Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC) e um sobre tricotilomania. O estudo sobre problemas cognitivos identificou que o Dronabinol não afeta

significativamente o desempenho em quaisquer tarefas, incluindo medidas de aprendizado, memória, vigilância, capacidade psicomotora. Quando avaliado a partir da Bioelectrical Impedance Analysis, 20mg de Dronabinol produziu pequena, porém significativa, diminuição no número de substituições de símbolos de dígitos inseridos corretamente (p<0,01) e na velocidade máxima atingida na tarefa de atenção dividida (p<0,01 ). A escala de performance de Karnofsky (avalia o desempenho dos pacientes por meio da capacidade física e da autossuficiência) diminuiu 2,5 pontos no grupo Dronabinol versus nenhuma mudança no grupo placebo (p=0,18). Turna et al avaliou o uso de Dronabinol em pacientes com TOC e com tricotilomania. Em dois casos refratários de TOC, foi observada melhora significativa da severidade dos sintomas após 10 a 14 dias, de acordo com a Yale-Brow Obsessive-Compulsive Scale, com o uso de 20-30mg/dia de Dronabinol. Já para o tratamento de 14 mulheres com tricotilomania com duração de 12 semanas, o Dronabinol dosado de forma flexível (dose efetiva média de 11,6 ± 4,1 mg / dia), apresentou efeito em 64,3% das pacientes, com redução ≥35% no ato de puxar o cabelo medido pela Escala CGI‐I, escala realizada por um médico psiquiatra que avalia a gravidade da doença.


Evento Adverso

Cinco revisões sistemáticas investigaram os eventos adversos do uso de canabinoides em transtornos mentais. Todas as revisões relataram que não foram identificados eventos adversos graves nos grupos com canabinoides. Entretanto, três revisões identificaram o desenvolvimento de sintomas de saúde mental em pacientes que receberam canabinoides de forma mais frequente do que os pacientes que receberam placebo. Ambos os estudos de Mucke e autores identificaram diferença estatística, sendo a primeira revisão com RD 0,05; IC95% 0,00 a 0,10; p≤0,05; I2=0; e a segunda com RD 0,10, IC95% 0,06 a 0,15; p<0,0001; I²=54%. De acordo com as categorias predefinidas, não houve danos clinicamente relevantes por medicamentos à base de cannabis. A qualidade da evidência foi baixa, rebaixada devido à indireta e inconsistência (I²>50%).

Whiting et al11 realizaram meta-regressão e análise estratificada não mostrou evidências de diferença na associação de canabinoides com a incidência de "qualquer Evento Adverso", com base no tipo de canabinoides, desenho do estudo, indicação, comparador ou duração do acompanhamento; análises adicionais foram realizadas para todos os estudos combinados. As metanálises para o número de participantes com qualquer EA não mostraram diferenças estatística. Não foram identificados estudos avaliando os EA de longo prazo dos canabinoides, mesmo quando as pesquisas foram estendidas para níveis mais baixos de evidência.


PANORAMA DA TECNOLOGIA PARA O SUS

O uso de canabinoides é regulamentado em alguns países, sendo o Dronabinol indicado para tratamento de anorexia em perda de peso excessiva em pacientes com Aids, em nome comercial de Marinol®. Entretanto, ainda é preciso monitorar os ensaios clínicos randomizados para algumas doenças, como o Transtorno de Ansiedade, Síndrome de Gilles de la Tourette e Transtorno de Estresse PósTraumático, onde a literatura demonstrou potencial terapêutico. No Brasil, a Anvisa aprovou o comércio controlado de Cannabis, realizado exclusivamente por farmácias e mediante receita médica de controle especial, prescritos em condições clínicas de ausência de alternativas terapêuticas disponíveis.


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